18 de nov. de 2012

Megaporto do sul da Bahia: Opção logística para os grãos do centro-oeste

Ibama aprova megaporto de R$ 3,5 bi no Sul da Bahia

Um dos mais importantes e polêmicos projetos de infraestrutura portuária do país vai sair do papel. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) deu sinal verde para a construção do Porto Sul, um megacomplexo portuário que será instalado em Ilhéus, no Sul da Bahia. Com investimentos estimados em R$ 3,5 bilhões e área total de 1,8 mil hectares, Porto Sul é defendido como empreendimento crucial para viabilizar o escoamento de minério do Sertão baiano, por ser o destino final da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol), malha que está sendo construída pela estatal Valec.



A licença prévia concedida pelo Ibama, conforme apurou o Valor, contempla a construção de um terminal de uso privativo da empresa Bahia Mineração (Bamin) e de um terminal de uso público. As duas estruturas serão usadas para o transporte de minério de ferro, soja, etanol e fertilizantes, entre outros granéis sólidos.

Para liberar a licença, o Ibama impôs ao governo baiano e à Bamin o atendimento a 19 ações compensatórias, além da implantação de 34 programas ambientais. Entre as medidas condicionantes estão projetos como o tratamento de resíduos sólidos, o incentivo à atividade pesqueira, a proteção à fauna terrestre e até um programa de prevenção à exploração sexual na região. Parte das ações exigidas pelo licenciamento deverá ter início imediato, enquanto outros projetos serão realizados ao longo da construção do porto e, em alguns casos, durante sua operação. O início efetivo das obras depende agora da comprovação de atendimento às condicionantes. A licença tem dois anos de validade.



A previsão é que a construção de Porto Sul gere cerca de 2,6 mil empregos diretos no auge das obras. O prazo total estimado para conclusão do empreendimento é de 54 meses. A partir daí, a estrutura passará a ser operada por cerca de 1,7 mil funcionários.

Desenhado para movimentar cem milhões de toneladas por ano, Porto Sul contará com ponte de acesso marítimo, na qual a atracação será a 3,5 km da costa. O porto, estudado há décadas, nasce dentro do novo modelo de concessão portuária preparado pelo governo. O projeto foi alvo de acusações de ambientalistas, que enxergam riscos de degradação em uma área de apelo turístico, cercada por riquezas naturais. Para viabilizar o empreendimento e reduzir suas fragilidades ambientais, o governo mudou o local de instalação, de Ponta da Tulha para Aritaguá.

Fonte: Valor Econômico/André Borges – publicado no site Portos e Logística, 16 de Novembro de 2012 .


8 de nov. de 2012

Porto de Itaqui: Logística do agronegócio brasileiro muda do sul para o norte



Com a obra, Itaqui receberá cerca de 30 milhões de toneladas de soja e milho que hoje são exportados pelo Sul

Foi lançada, na manhã do dia 07 de novembro de 2012 a pedra fundamental para a construção do Terminal de Grãos do Maranhão (TEGRAM), no Porto do Itaqui, em São Luís (MA). 
A obra vai mudar a rota de exportações do país e será fundamental para o desenvolvimento do agronegócio das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.


Embarques de grãos: TEGRAM do porto de Itaqui mudará o eixo logístico atual do sul-sudeste para o norte do Brasil.

Com operação prevista para o final de 2013, o Terminal permitirá que a capacidade instalada para armazenagem e exportação de soja, milho e farelo do Itaqui salte dos atuais 2,5 milhões de toneladas de grãos/ano para até 15 milhões de toneladas/ano até 2020, o equivalente a um terço do potencial para exportações de grãos pelos portos do Norte e Nordeste.         

Hoje, cerca de 85% da soja e do milho exportados pelo Brasil saem pelos portos de Paranaguá, Santos e São Francisco do Sul, que enfrentam sérios gargalos de logística. Com a implantação de novos terminais no Norte do país, estima-se que dois terços das cargas transferidas hoje para portos do Sul e Sudeste, cerca de 30 milhões de toneladas, sairiam pelos portos da região conhecida como Arco Norte do país.         

Quando o TEGRAM estiver operando em sua capacidade plena, cerca de 11,5% da produção de grãos do país vai passar pelo Itaqui, o que posicionará o porto entre os três maiores do país.           

Logística integrada ao Itaqui vai gerar economia no agronegócio      

A construção do TEGRAM, a entrada em operação da Ferrovia Norte-Sul, que liga Palmas - TO a Açailândia - MA, e a sua conexão com a Estrada de Ferro Carajás (EFC) criaram as bases para o corredor que tem o Porto do Itaqui como destino.

Atualmente, o custo logístico total (terrestre, porto, aduana, transporte marítimo e documentações) para exportação de uma carga de soja que sai de uma fazenda em Balsas, principal município produtor de grãos no Sul maranhense até o Porto de Santos é de cerca de US$ 140 por tonelada. Se a mesma carga for exportada via porto do Itaqui, o custo sai por US$ 115 por tonelada, ou seja, uma economia de US$ 25 por tonelada, que representa quase 18%.      
Obras de ampliação do canal do Panamá: Navios graneleiros (atuais post-panamax) com capacidade de até 160 mil tons, terão no porto de Itaqui melhor infraestrutura operacional e maior proximidade com o canal comparativamente aos portos do sul-sudeste do Brasil.

Na parte do transporte terrestre, especialistas do setor do agronegócio estimam que a redução entre 500 e mil quilômetros para chegar a um terminal de exportação darão ao produtor uma economia no transporte que será revertido em adicional de renda de até R$ 3,00 por saca de milho ou de soja.  

Soma-se a isso a ampliação do Canal do Panamá, que com a obra permitirá passagem de graneleiros de até 60 mil toneladas para 150 mil toneladas. Na rota para a Ásia, principal destino da soja brasileira, estima-se uma redução no frete da ordem de 20%, o que beneficiará portos como o Itaqui, no Maranhão.   

Além do Maranhão, a obra vai impactar, principalmente, os estados produtores de grãos Tocantins, Piauí, Mato Grosso e Bahia. O cenário é favorável aos portos do Maranhão e do Pará que surgem como via alternativa de exportação em relação a Santos e Paranaguá. Para se viabilizar nesse mercado em ascendência, a estratégia é começar a operar ao final de 2013, antes que projetos semelhantes nos estados vizinhos saiam do papel.   
       
Ferrovia Norte-Sul: Bitola larga, projeto moderno de alta performance reduz o custo de transporte do agronegócio para exportações.  A malha ferroviária do sul do país ficou estagnada no tempo.

Cenário favorável à expansão agrícola         


Dos principais países exportadores de grãos (Estados Unidos, Argentina e Brasil), apenas este último não está no limite das suas fronteiras agrícolas. Isso torna o Brasil o único a reunir as condições para ofertar um volume de mais 25 milhões de toneladas de grãos até 2020, e atender com mais expressividade a uma demanda mundial que crescerá 50 milhões. Pelas estimativas, o crescimento populacional, além do crescimento da renda das populações, especialmente na Ásia, vai continuar pressionando o aumento da produção mundial por alimentos, e nesse sentido os estados do arco Norte  terão grandes oportunidades.     

De acordo com dados da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), no ano passado, 45,5 milhões de toneladas produzidas acima do paralelo 16 (Norte, Nordeste e parte do Centro Oeste) percorreram grandes distâncias até os portos de exportação do Sul e Sudeste, especialmente Santos e Paranaguá, por incapacidade dos portos do norte de escoarem essa produção e viabilizar uma logística mais eficiente.  O TEGRAM faz parte desse novo cenário e responde uma parte importante da infraestrutura que precisa ser gerada para a consolidação desse novo corredor de exportação.       

Em alguns estados localizados na área de influência do Terminal de Grãos do Maranhão, como Bahia (14%), Mato Grosso (12%) e Piauí (10%), a expectativa é de aumento da área plantada. As projeções da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) são de produção recorde de soja para o Brasil, entre 80,063 milhões e 82,817 milhões de toneladas. O crescimento previsto varia de 13,680 milhões de toneladas (+20,6%) a 16,434 milhões de toneladas (24,8%) para a próxima safra. O volume de grãos, de acordo com a Conab, na safra atual pode chegar a 182,27 milhões de toneladas, contra 165,7 milhões da safra passada.

Área de influência do TEGRAM deve atrair cadeia do agronegócio    

Na esteira do crescimento da produção de grãos no Brasil e da demanda internacional, o Maranhão reunirá as condições para o adensamento da cadeia do agronegócio na área de influência do TEGRAM e deverá atrair empresas de setores relacionados, como fertilizantes e até mesmo produção de carnes.


Porto de Itaqui: Águas profundas e na rota do graneleiros post-Panamax que operarão no novo canal do Panamá.

Atualmente, 75% da produção de carnes (bovina, suína e de frango) são destinados ao mercado interno e o consumo per capita só aumenta. A produção de carnes deverá crescer, segundo o Ministério da Agricultura em mais de 12,6 milhões de toneladas até 2018/2019. Na mesma esteira, os setores canavieiro e florestal terão uma grande expansão à medida que a confiança do empreendedores aumentar sobre a capacidade portuária para as exportações.

Com a alteração na geografia de produção de grãos do Sul para o Centro-Norte, Nordeste e Centro-Oeste do país, novos corredores de exportação foram sendo criados em substituição aos tradicionais. Desta forma, os portos do Sul e do Sudeste tendem a receber produtos mais elaborados e conteineirizados, enquanto os estados ao Norte do Brasil devem ampliar o atendimento do mercado de granéis, especialmente soja e milho.    

Outra mudança importante e que corrobora para a mudança do eixo de exportação do agronegócio é a criação de infraestrutura de transporte com a construção de novos trechos ferroviários, a melhoria ou construção de milhares de quilômetros de rodovias rumo aos terminais do Arco norte.          

SOBRE O TEGRAM         

O Consórcio TEGRAM - formado pelas empresas NovaAgri Infra-Estrutura de Armazenagem e Escoamento Agrícola S.A, Glencore Serviços e Comércio de Produtos Agrícolas Ltda, CGG Trading S.A e Consórcio Crescimento, integrado pelas empresas Louis Dreyfus Commodities Brasil S.A e Amaggi Exportação e Importação Ltda. – ofertou à Empresa Maranhense de Administração Portuária (EMAP) R$ 143,1 milhões a título de taxa de oportunidade de negócio. Outros R$ 322 milhões serão investidos para a construção do terminal até o final de 2013. 

O TEGRAM ocupa uma área total de 161.308 m² e terá capacidade estática de armazenamento de 500 mil toneladas (base soja), compreendendo quatro armazéns com capacidade de 125 mil toneladas/cada. Em sua etapa final, prevista para 2020, movimentará até 15 milhões de toneladas/ano.

FONTE:

5 de nov. de 2012

A longa e brutal jornada até um porto no Brasil

O artigo a seguir, publicado pela revista PORTOS E NAVIOS, é um dos melhores exemplos de fato do caos que se encontra a logística brasileira. O país do agronegócio e um dos celeiros globais, está com sua infraestrutura de transportes obsoleta, tecnologicamente distante das melhores práticas para o setor.

Uma simples viagem de um caminhoneiro, como narrada a seguir, retrata com fidelidade os gargalos que nos desafiam a superar como nação, além de abrir um vasto cenário de oportunidades para investimentos e negócios.

O tempo urge, ou a janela de oportunidades se fechará, com graves consequências futuras.

Boa leitura e reflexão! 
      
A longa e brutal jornada até um porto no Brasil

RONDONÓPOLIS, Mato Grosso - Quando o jovem caminhoneiro Marcondes Mendonça inicia a viagem para transportar milho do Centro-Oeste do Brasil até o distante porto de Santos, ele reza para ser protegido dos buracos nas estradas e dos motoristas alucinados, e pensa com terror nos lamentáveis banheiros que precisará encarar nos sete dias de viagem.


Soja sendo colhida e carregada no caminhão que seguirá para o porto. O começo da aventura .

Ele também se prepara para outros inconvenientes: congestionamentos, atrasos no porto e uma burocracia que cada vez mais atrapalha o fluxo de bens e serviços no maior país da América Latina.

O gargalo da infraestrutura é um dos maiores desafios enfrentados pelo Brasil, sexta maior economia mundial e um dos celeiros do mundo, com chances de desbancar na temporada 2012/13 os EUA como maior produtor mundial de soja.

Neste contexto de aumento de produção e logística deficitária, os transportadores avaliam que o preço do frete rodoviário deve crescer cerca de 30 por cento. A escassez de caminhoneiros e uma nova lei que determina períodos mínimos de descanso para esses profissionais também colaborarão para o aumento dos custos na nova safra, já que o tempo de viagem crescerá.
Para ver o problema de perto, um repórter e um fotógrafo da Reuters pegaram carona com Mendonça numa viagem recente. O caminhoneiro de 27 anos, pai de dois filhos e fã de música sertaneja, trabalha para uma cooperativa de frete e faz bico como instrutor para futuros colegas.
"Que Deus nos proteja", disse ele, com a voz impondo-se a um chiado do freio a ar do seu veículo.
A reportagem seguiu com o veículo por 1.600 dos 2.100 quilômetros da viagem, percorrendo muito asfalto danificado, lembranças de acidentes mortais e refúgios noturnos com espaço para um último caminhão.

Depois de mais de mil quilômetros, próximo ao porto. Viagem estafante e onerosa.

A viagem começou em Mato Grosso e atravessou outros dois Estados até chegar ao porto de Santos (SP). Nesse percurso, Mendonça enfrentou condições conhecidas dos caminhoneiros de qualquer lugar --longas jornadas de trabalho, solidão, comida ruim.
Mas a viagem também deixou claro como a ineficiência atrapalha a ambição brasileira de se tornar um fornecedor ainda mais importante de alimentos para o mundo.

O custo do frete nessa viagem representou quase 40 por cento do valor pelo qual a carga de 37 toneladas de milho foi negociada em Santos. Para percorrer uma distância semelhante nos EUA, principalmente sobre barcaças, o custo seria de apenas 10 por cento do valor da carga.

O transporte de produtos no Brasil também pode demorar o triplo do que numa distância semelhante na China, país que tem usado seu sucesso econômico para investir pesadamente em estradas, ferrovias e portos.

"A logística está congestionada", disse Glauber Silveira, produtor de Mato Grosso, presidente da associação dos sojicultores do Brasil, que perdem um quarto do seu faturamento com o transporte. "O comprador está perdendo, e o produtor está perdendo."

Com um território vasto, abundância de água e fazendas de alta tecnologia no interior, o Brasil é atualmente o maior produtor mundial de açúcar, café e suco de laranja, além de liderar a exportação de carne bovina e de frango e estar prestes a se tornar o maior em soja.
Mas a vantagem que o Brasil costumava ter em termos de custo está sucumbindo ao preço do transporte. O frete da fazenda ao porto já custa no Brasil mais do que o dobro do frete marítimo até a China, e essa relação está crescendo rapidamente por causa do pagamento de melhores salários para os caminhoneiros e da entrada em vigor de uma lei que exige um descanso mínimo para eles.

Terminais portuários congestionados pela má logística ferro-rodoviária. Custo Brasil.

Por causa dessa elevação de custos, os negociantes de produtos agrícolas estão sendo obrigados a pagar mais pela soja brasileira só para garantir a continuidade das lavouras. Caso os preços se aproximem demais do custo, isso "irá desincentivar seriamente a produção brasileira", segundo Kona Haque, analista do Macquarie Bank.

A presidente Dilma Rousseff divulgou recentemente planos para atrair 66 bilhões de dólares em investimentos privados para estradas, ferrovias e outras instalações. A carência de infraestrutura causa não só um aumento nos custos, como também gera temores de que o Brasil possa não estar preparado para receber a Copa do Mundo de 2014 e a Olimpíada de 2016, dois eventos que deveriam servir de vitrine para a ascensão do país.

FORA DOS TRILHOS
Da cabine do caminhão Scania de Mendonça, descortina-se uma visão privilegiada do abismo que separa as ambições de primeiro mundo do Brasil das condições bem mais modestas da vida real.
A Reuters embarcou nessa jornada numa tarde de segunda-feira em Rondonópolis, entreposto logístico no sul de Mato Grosso. A essa altura, Mendonça já havia passado três dias em viagem até uma cidade, mais ao norte, onde lotou suas duas carretas com milho.
De Rondonópolis, ele seguiu para o sul. Rosários de contas pendem do espelho retrovisor, acompanhando cada balanço do caminhão.

Três horas depois da partida, o caminhão chegou a Alto Araguaia, onde a jornada de Mendonça já poderia terminar. Lá a empresa América Latina Logística opera uma ligação ferroviária direta até Santos.

Cada trem da companhia, com 80 vagões, pode transportar o equivalente a 230 caminhões articulados como o de Mendonça, mas consumindo o mesmo diesel que apenas 40 carretas. No entanto, a demanda elevada depois da safra faz com que os trens fiquem lotados, e os preços não compensam muito, segundo produtores.

Além disso, o trem leva o mesmo tempo, pois demora muito para ser carregado nas várias paradas do percurso e para descer a serra do Mar, logo antes de chegar ao porto.
A rede ferroviária brasileira, de 29 mil quilômetros, é menor atualmente do que há 90 anos. Como parte do seu projeto de infraestrutura, o governo Dilma está investindo 22,4 bilhões de reais para construir duas novas ferrovias importantes para atender ao cinturão agrícola. Uma delas será no sentido norte-sul, e a outra, no eixo leste-oeste.

Empresas de commodities dizem que há urgência nessas obras. Numa pesquisa feita pela Fundação Dom Cabral junto a 126 empresas que geram mais de um quarto do PIB brasileiro, a principal sugestão para a redução do custo do frete é a construção de mais ferrovias.
Os economistas têm dificuldades para quantificar o impacto da infraestrutura precária sobre a economia, mas concordam que as limitações na rede de transportes e a saturação dos portos impedem a economia de crescer consistentemente acima de 4 por cento ao ano, taxa que a maioria dos economistas considera que seria necessária para que o Brasil alcançasse o status de nação desenvolvida.
A maioria dos novos projetos ferroviários ainda está a pelo menos cinco anos da conclusão.

NA BOLEIA
E assim Mendonça seguiu viagem. Antes da meia-noite, ele parou num posto com área de descanso. Mendonça dormiu num colchão no fundo da cabine. Repórter e fotógrafo se viraram com um banco e uma rede.
Na terça-feira, o veículo chegou à divisa com Mato Grosso do Sul. O voo de um tucano e um bando de emas quebravam a monotonia da paisagem plana e marrom dos campos na entressafra.

Fila de caminhões na descida da Serra do Mar em direção ao porto. Ferrovias consomem apenas 16% de energia gasta pelo modal rodoviário.  Quarenta vagões equivalem a 240 caminhões!

Mendonça contava sua história para ajudar as horas a passarem. Nascido no vizinho Goiás, ele é filho e irmão de caminhoneiros. Ávido por aprender, ele guiava os caminhões dos clientes pelo pátio da borracharia do seu tio. "Eu tinha a permissão deles", ressaltou.

Em 2006, mudou-se para Rondonópolis e começou a trabalhar, ganhando cerca de 3.000 reais por mês. Engordou 24 quilos no primeiro ano que passou ao volante. Casou-se. O trabalho é constante, mas as transportadoras têm dificuldades para encontrar novos motoristas. Com o desemprego próximo do seu menor nível histórico no Brasil, os trabalhadores encontram muitas outras oportunidades em profissões menos cansativas.

"Não há banheiros nem áreas de descanso decentes, e a poeira está por todo lado", queixou-se o caminhoneiro Aguinaldo da Silva Tenório, de 28 anos, numa parada do trajeto. Ao seu lado viajam sua mulher, sua filha de três anos e um filho de um mês. Levá-los consigo foi "a única opção" para poder ficar com a família.

Os caminhoneiros também se queixam dos perigos --roubos ocasionais e estradas ruins e congestionadas.
Viajando pelo Mato Grosso do Sul, Mendonça apontou o local onde um motorista bêbado bateu o seu caminhão, num acidente que matou a namorada do condutor do carro.
Com frequência, os motivos de maior preocupação dos motoristas são seus próprios colegas. Na pressa de chegar ao porto --muitos são pagos por frete--, os caminhoneiros fazem ultrapassagens imprudentes. Muitos também usam cocaína e "rebite", uma droga derivada de anfetaminas, para se manterem acordados.

"Quando você está sonolento, resolve, mas você pode acabar causando uma grande confusão", diz o caminhoneiro Ademir Pereira, de 36 anos, que admitiu ter usado "rebite" uma vez. Mendonça diz que nunca consome drogas para ficar acordado.

Terminais, silos portuários e corredores de exportação  brasileiros dos anos 70, ainda em operação. 

OLHOS ABERTOS
Mais de 1.200 caminhoneiros morreram no ano passado em rodovias federais, segundo dados da Polícia Rodoviária Federal. Para reduzir o consumo de drogas ao volante e diminuir o número de vítimas, o governo recentemente determinou pela primeira vez um período mínimo de descanso para os caminhoneiros.

Motoristas contratados por empresas, que são a maioria, agora devem passar no máximo oito horas por dia ao volante. Para os autônomos, a jornada pode chegar a 13 horas.
Na terça-feira à noite, Mendonça dormiu em outra área de descanso. Ao meio-dia de quarta, ele parou em um restaurante já no norte do Estado de São Paulo.
Lá, uma funcionária elogiou a nova lei.
"Antes, a gente via os caminhoneiros entrando aqui com os olhos quase fechados", disse Nilda Pereira Alves Pinto, que opera o aparelho de radioamador do restaurante, promovendo suas porções de arroz e feijão para os motoristas nos arredores. "Agora eles não ficam mais com tanta pressa."

Poucos discordam dos motivos da lei, mas alguns se queixam de que está mais difícil cumprir prazos, e que os custos aumentaram. "Se não nos deixarem dirigir durante a noite, não haverá caminhões suficientes", disse o caminhoneiro autônomo Marcelo Galbati, que esperava o conserto de um pneu.

Os planos de Dilma incluem o prolongamento de uma rodovia até um terminal fluvial no rio Tapajós, afluente do Amazonas. Apesar de ter alguns dos maiores rios do mundo, o Brasil realiza pouco transporte fluvial de cargas.
Essa nova ligação oferecerá, a partir de 2014, uma redução de 900 quilômetros no trajeto até o Atlântico, mas a capacidade das barcaças ficará limitada por causa da pequena profundidade dos rios.

Na noite de quarta-feira, a reportagem passou por fora de São Paulo, maior cidade da América do Sul, e o tráfego ficou mais pesado à medida que caminhões de todo o Brasil se afunilavam nas duas rodovias que dão acesso a Santos, a cerca de 80 quilômetros da capital paulista.

A falta de áreas de descanso ficou dolorosamente clara. Mendonça pagou um pedágio de 150 reais, mas precisou dar uma volta e pagar de novo depois de descobrir que todas as áreas de descanso estavam cheias. Ele já havia ultrapassado a jornada de trabalho máxima, mas não tinha onde parar.

Às 2h, quando o caminhão descia a serra em meio à Mata Atlântica, um acidente paralisou a rodovia. Uma hora depois, o veículo chegou a uma parada de descanso.
"A coisa está feia", disse uma atendente, acenando para que Mendonça tentasse a sorte buscando uma vaga para estacionar, após 20 horas ao volante.

Na manhã de quinta-feira, Mendonça esperava autorização para seguir até o terminal portuário, a 20 quilômetros dali, onde a trading norte-americana de commodities ADM (Archer Daniels Midland Co.) recebe os caminhões com grãos, para então despachar o produto em navios graneleiros.

O porto é famoso por sua burocracia, e não dá conta do crescente volume de carga que recebe. Só depois das 16h o terminal ficou disponível para Mendonça. A essa altura, porém, descarregar significaria ir embora do porto bem tarde, e novamente enfrentar dificuldades para achar uma área de repouso. Por isso, Mendonça decidiu dormir na área de espera do terminal.

O final da saga. Carregamento dos grãos nos navios graneleiros com imensos custos em toda a cadeia logística.
Só na manhã de sexta-feira, quase uma semana depois de deixar Rondonópolis, Mendonça conseguiu finalmente levar o caminhão para uma plataforma e descarregá-lo, a poucos metros dos navios que iam sendo enchidos com grãos com destino a outros continentes.
O valor da carga de 37 toneladas: 10.200 dólares. O custo do frete: 3.800 dólares.

Fonte: 
Reuters/Por Peter Murphy/Com reportagem adicional de Brian Winter em São Paulo