29 de mar. de 2012

Guerra Fiscal e os Portos: "Considerações sobre os incentivos fiscais nos portos catarinenses"

Artigo  publicado no site PORTOGENTE e reproduzido com autorização da autora.

Considerações sobre os incentivos fiscais nos portos catarinenses

* por Hilda Rebello

Os portos catarinenses são importantes ferramentas logísticas e tem se desenvolvido nas últimas décadas por conta do expressivo aumento do comércio exterior brasileiro, abarcando, as cargas do estado de Santa Catarina e as de outros estados. Isso se dá principalmente, devido à excelente infraestrutura portuária, facilidade de acesso terrestre e áreas de apoio logístico. Contudo, é inegável que parte desse crescimento ocorrido nos últimos sete, oito anos se deu também, por conta dos incentivos fiscais concedidos pelo estado para as cargas de importação que aqui desembarcam.

Portos de Navegantes e Itajaí - SC
Nas últimas semanas, governo, empresários, associações e o meio portuário, não tem discutido outra coisa, que não seja a questão da perda, pelos estados, da concessão dos benefícios fiscais para as cargas de importação. De um lado, a defesa pela permanência dos incentivos sob a alegação de que decisão do governo de desengavetar a Resolução 72/2010 objetivando a uniformização do percentual do ICMS trará danos irreparáveis para a economia dos estados, de outro a de que os incentivos são os grandes vilões da desindustrialização do país e que portanto devem acabar.

Porto de Imbituba - SC
Que a perda dos incentivos afetará no curto prazo a economia do estado é fato, porém, o próprio mercado tem facilidade de adaptação e pode criar outros mecanismos que possam compensar estas perdas a fim de continuar competitivo. Um deles é trabalhar a vantagem competitiva dos portos catarinenses no que se refere á logística. As cargas que não desembarcarem aqui, em sua grande maioria, desembarcará no Porto de santos, um porto com sérios problemas logísticos que notadamente não daria conta das cargas adicionais.
Porto de São Francisco do Sul - SC
Seria então a grande oportunidade dos portos de Santa Catarina, e aqui se pode destacar o Complexo Portuário de Itajaí, de oferecer vantagens adicionais aos donos das cargas fazendo um pesado marketing institucional destacando, a priori a competitividade. Enquanto uma carga levaria dias para ser liberada no porto santista, pagando armazenagem e demurrage, os portos catarinenses liberariam esta mesma carga com tal rapidez, que as mesmas chegariam ao destino antes da liberação em Santos.

Assim, o foco fica na qualidade da prestação de serviços, agilidade nas liberações e preços mais competitivos. Além de compensar a perda do benefício, tornará os portos catarinenses mais fortes no mercado.

Porto de Itapoá - SC

Os incentivos não são os únicos responsáveis pela desindustrialização, eles são apenas uma ponta pequena do iceberg do conhecido custo Brasil: A alta carga tributária, deficiência logística, falta de investimentos públicos, juros altos entre outros.

Outra questão a se levar em conta é de que a maioria dos produtos importados é formada por insumos, matérias-primas e maquinários para modernização do parque fabril, ou seja, vem agregar valor e competitividade a cadeia produtiva. Sem os incentivos, o setor produtivo perde a chance de modernizar sua indústria e melhorar seu produto para torna-lo mais competitivo.

É sabido também que o Brasil se mantém no comércio internacional, devido ás exportações de commodities especificadamente, petróleo, soja e minério de ferro. O governo não incentiva a industrialização e a exportação de produtos com valor agregado, logo, contribui de forma crucial para a desindustrialização.

Não podemos temer um colapso nos nossos portos agora. O mercado possui grande capacidade de adaptação. Crises vêm e vão e em geral se ajustam ao sabor das conveniências.

Sem apontar as questões de interesses políticos e empresariais relacionadas ao fato, vale também lembrar que Santos receberá dois grandes empreendimentos portuários, que para operar com a capacidade anunciada, precisarão que estas cargas retornem para lá. Melhor aguardar os acontecimentos!

* Hilda Rebello é especialista em Gestão Portuária e professora da Univalli em Santa Catarina.

24 de mar. de 2012

NOVOS TEMPOS NOS PORTOS DO PARANÁ

Publicado simultâneamento com a coluna "Minha Opinião" no jornal eletrônico Correio do Litoral (Guaratuba-PR):

Pois é... Não é fácil ser comandante do segundo maior porto do Brasil. Especialmente pilotando um navio a vapor, quando os tempos requerem um navio de alta velocidade. Passei sete anos nesta máquina imensa e desafiadora, sendo um ano e meio como superintendente.

É tensão total durante 24 horas ao dia!


A demissão do Airton Maron da superintendência da APPA (Administração dos Portos de Paranaguá e Antonina) pelo governador Beto Richa, surpreende pela forma fulminante que ocorreu no último dia 16 de março, é quase uma daquelas tragédias anunciadas. O governador deve ter razões secretíssimas que dificilmente serão publicas.

Conheço razoavelmente o Maron e mais ainda o seu sucessor, o Luiz Henrique Dividino.

Luiz Henrique Dividino, novo Superintendente da APPA a partir de 20/03/2012.


Em setembro de 2010, antes das eleições para governador do Paraná e em plena campanha acirrada entre Beto Richa e Osmar Dias, escrevi no meu blog PONTO A PORTO uma postagem onde eu dizia que qualquer que fosse o eleito, o novo superintendente do porto deveria sair do grupo que chamei de “Quatro Azes”.

No artigo, me atrevi a traçar um perfil de um dirigente portuário para enfrentar estes novos tempos de competição acirrada, produtividade como pré-requisito, modernização não apenas da infraestrutura física, mas da gestão da administração portuária.

Vejamos o que dizia:

O futuro gestor portuário deve dominar os seguintes conhecimentos:

1. O marco regulatório e legal do setor portuário nacional.

2. Gestão pública e estrutura organizacional portuária.

3. Logística, operação e infraestrutura portuária.

4. Visão e gestão estratégica com liderança.

Com base nestes critérios que sintetizam os diversos atributos que um profissional deve dominar para ser considerado “ideal” para atuar no comando dos portos, busquei identificar na comunidade portuária paranaense, profissionais que se enquadram e atendem estes pré-requisitos.

Estes profissionais são do meu relacionamento pessoal e não sabem da minha intenção de citá-los nesta postagem. Como o propósito é de demonstrar o valor que possuem para o setor portuário paranaense, que me perdoem se for mal interpretado.

Então listei quatro pessoas do meu conhecimento que cabem perfeitamente neste quadro, que são:

CLÁUDIO DAUDT da empresa Cattalini Terminais S/A.

JUAREZ MOARES E SILVA presidente do TCP Terminal de Contêineres de Paranaguá S/A;

LUIZ ANTÔNIO FAYET ex-presidente do BADEP, ex-diretor do Banco do Brasil e consultor da CNA – Confederação Nacional da Agricultura

LUIZ HENRIQUE TESSUTTI DIVIDINO presidente da Terminais Portuários da Ponta do Félix S/A.



Vocês não imaginem o que fui criticado e tipos de comentários que recebi no blog quando Beto Richa foi eleito e Airton Maron anunciado como o futuro superintendente da APPA.

Só me reservei ao direito de responder na época, que o governador tem todos os poderes pra nomear quem ele queira, mas que a minha opinião sobre os perfis necessários a uma gestão de primeiro mundo do porto, estas continuavam focadas nos “Quatro Azes”.

Passados quatorze meses de gestão do Maron, no dia de sua demissão tive vários sentimentos: Um de alegria por acertar minhas previsões e visão do que é efetivamente gestão portuária. Outro, de tristeza de ver como a politicagem é perversa ao usar uma autarquia pública para fins eleitoreiros e demagógicos... Sem entrar em outros méritos que falam pelos bastidores.

Vamos falar dos novos tempos:

Meu ex-colega de gestão da APPA, o Luiz Henrique foi muito bem formado durante sua vida profissional.

Há 24 anos vem acumulando conhecimentos e experiências na área: desde tecnologia da informação, operação portuária, planejamento, modelagem de terminais portuários entre outros. Só na APPA atuou de 1994 a 2008 quando saiu para assumir a presidência do Terminal Ponta do Félix, selecionado pelos acionistas privados.

Seu críticos o rotulam ora como “requianista” e ora como “ lernista” como se tais adjetivos fossem ofensas. O certo é que é um técnico como eu.

Portanto, a diferença de estilos é imensa: O que saiu era da casa, sem outras experiências de gestão fora da APPA, além de comprometido com o corporativismo da autarquia, das ações trabalhistas que ele mesmo possuía e amizades paroquiais na cidade desde criancinha. Instrumento do projeto político de seu primo para conquistar a prefeitura de Paranaguá, o que é uma mistura mortal pro porto pra quem deve ser Autoridade Portuária.

Sua rápida passagem, mais pareceu que lhe entregaram uma Kombi velha cheia de gente dos mais variados interesses, mas com a cobrança que tivesse o desempenho de um carro de Fórmula 1. Ficou de mãos atadas, além de perder o controle do veículo e de seus ocupantes.

O que entra, traz consigo a visão ampla de vários tipos de gestão moderna de terminais portuários com o pleno entendimento do que é gestão pública e seus entrelaçamentos políticos, muitas vezes conflitantes com o interesse da técnica pura, da macrologística e da importância econômica de um porto. Assim, passado exatos 17 meses, um dos “azes” que recomendei chega ao posto maior da gestão portuária do Estado.

Chega com imensos desafios: Prioritariamente a questão da dragagem desde o Canal da Galheta (que dragamos na minha gestão em 2009, e depois... nada!) até o porto de Antonina que está sendo novamente prejudicado com o assoreamento intenso e rebaixamento do calado pela Capitania dos Portos. Isto poderá acontecer com a Galheta em curto prazo em pleno embarque da safra agrícola... Uma armadilha para a nova gestão da APPA.

Mas, estou certo que o Luiz Henrique Dividino não nos decepcionará. É piloto da “Fórmula 1 portuária”, basta que o governador e o secretário de Transportes lhe dêem apoio total.

Boa sorte Luiz! Você faz parte dos novos tempos para o litoral do Paraná.

É a minha opinião.

17 de mar. de 2012

"O Japão? ... Não é aqui!"

Publicado simultâneamente no jornal eletrônico Correio do Litoral


Imagine que Deus, do alto de sua piedade chama um dos seus anjos-assessores e dá uma ordem: “Na Terra tem um lugar chamado Japão, que foi atingido por terremoto terrível, ondas gigantes, catástrofe nuclear e 20 mil vidas foram perdidas. Já faz um ano, mas eles ainda devem precisar de ajuda. Vá lá coopere para que tudo se reconstrua.”

Tragédia na cidade pesqueira do Japão: E se fosse no Brasil?

O anjo-assessor, emocionado com a missão divina, sequer perguntou as coordenadas geográficas desse lugar chamado Japão. Saiu respeitosamente da presença de Deus e foi cumprir sua missão.

Já travestido de humano, começou a percorrer a Terra a procura de pontes caídas, estradas e casas devastadas que pareceria com o lugar indicado pelo Mestre.

Aterrissou primeiramente na região serrana do Rio de Janeiro, devastada há mais de um ano por chuvas torrenciais, enchentes, deslizamentos de terra, mortes e com tudo ainda por reconstruir.

O nosso assessor angelical, com os poderes linguísticos que Deus lhe deu, perguntou a um brasileiro “deitado eternamente desabrigado” da periferia de Petrópolis: “Aqui é o Japão?”.

O brasileirinho assustado respondeu sentado no seu banquinho à sombra de parte que sobrou da casa: “Não é não senhor! Até eu queria que fosse. Estamos há mais de ano querendo reconstruir nossas casas, estradas e... nada! O Japão é muito mais longe daqui!”.

Surpreso com o cenário de destruição que via, não entendia por que Deus não tinha comentado sobre aquele lugar no Brasil.

Viajou mais para o sul chegando a um lugar chamado “Litoral do Paraná”. Lá encontrou gente reclamando de chuvas, destruição, estradas e pontes caídas, casas perdidas em deslizamentos de terra etc. etc. Parecia que tinha chegado, enfim, ao lugar certo: “Aqui é o Japão?” pergunta o viajante celestial.

“Não!”, repetiam as pessoas de Morretes, Antonina, Floresta e bairros vizinhos.

Nosso incrédulo anjo-assessor vendo por estes lugares tanta destruição, pontes improvisadas com pedaços de árvores caídas pela destruição há mais de um ano, ficava pensando: “Onde será que fica esse Japão?”.

Até que uma alma caridosa lhe indicou o caminho certo para chegar ao lugar que Deus lhe ordenara. Ficava no outro lado do planeta, era uma ilha vulcânica conhecida por todo mundo naquelas bandas.

E lá se foi nosso anjo.

Aterrissa finalmente no Japão e em Tóquio pergunta onde há um ano teve terremotos destrutivos, tsunami, estradas e pontes destruídas onde muitas vidas se perderam.

Todo mundo sabia onde eram os lugares e guiaram nosso viajante divino.

De automóvel, no caminho só via belas e bem conservadas rodovias, pontes, casas em construção, máquinas trabalhando... A vida corria normalmente.

 Fotos do Tsunami no Japão Antes e DepoisFotos do Tsunami no Japão Antes e Depois 
A japonesa desabrigada pelo tsunami em mar/11 e hoje no mesmo lugar com seu filho. E no Brasil?

Perguntou às pessoas: “Tem certeza que aqui é Japão?!”.

As pessoas incrédulas com aquelas perguntas “tolas” respondiam “sim aqui é o Japão!”.

Mas, nosso anjo se perguntava meio atônito: “Estive no Brasil e só vi destruição e pessoas desesperadas e esperando há um ano pela reconstrução de suas casas e vidas. Será que Deus me mandou ao lugar certo? Aqui está quase tudo reconstruído!”.

Desolado, o anjo-missionário volta aos céus e se queixa pra Deus, dizendo que o Japão foi destruído em escala imensamente maior na mesma época que algumas regiões do Brasil, está quase reconstruído. As estradas são ótimas, as pontes novas e sinalizadas, o desastre nuclear controlado, as máquinas e a reconstrução a todo o vapor. Enquanto isso no Brasil...

Deus pensativo ficava se indagando: “Em que fase da criação eu errei?”.

Dedico esta coluna às famílias que perderam nestas catástrofes seus bens, sonhos, pessoas amadas, projetos de vida e ainda estão à mercê da sorte.

Enchentes e deslizamentos em Morretes e Antonina. Morretes, 12-02-2011.Foto: Orlando Kissner/AENotícias
 Destruição em Morretes-PR em Março 2011

Pessoas como a cantineira Dila na área do porto de Paranaguá que hoje abriga em sua casa seus pais idosos, como milhares de brasileiros, tiveram seu sítio destruído no bairro Floresta em Morretes e até hoje não têm ajuda oficial.

Enquanto lemos aqui no Correio do Litoral as notícias sobre discussões políticas sobre “liberação de verbas”, o tempo consome a dignidade e a vida das pessoas.

Realmente, aqui não é o Japão.

É a minha opinião!