E se a estrada de ferro cortar o litoral do Paraná?
O Correio do Litoral publicou há alguns dias, a notícia da discussão dos traçados propostos para o novo pacote de investimentos em infraestrutura ferroviária para o sul do Brasil anunciados pelo Governo Federal, com reações do governo do Paraná.
Pois é, fiquei pasmo! Explico até o final...
Quando estava na diretoria da administração dos portos do Paraná, participei de inúmeras reuniões de trabalho com meus pares da Ferroeste, a empresa pública estadual para ferrovias. Estávamos sintonizados com o visionário e batalhador Samuel Gomes, presidente da estatal à época: tanto a empresa quanto o porto têm o futuro dependente do outro.
Corredor de exportação de grãos do portos de Paranaguá: Cada vez mais dependente do modal ferroviário de baixo custo para escoar os excedentes da produção do centro-oeste brasileiro.
Hoje, é a
agricultura do Mato Grosso do norte e sul, Goiás, Rondônia, Tocantins, Triângulo
Mineiro, sul da Bahia, sul do Pará e até do Maranhão que estão produzindo os
grandes volumes exportáveis de soja, milho e carnes.
Não é à toa
que empresas brasileiras do agronegócio como o Grupo Maggi, Coamo, Cotriguaçú e
multinacionais como Cargill, ADM, Louis Dreyfus, Bunge, Noble e muitas outras,
já possuem ou estão montando terminais nos rios e portos no norte do país, como
Itacoatiara, Santarém e Itaqui e por aí vai.
Mas e os
portos do sul, como Paranaguá, São Francisco do Sul e Rio Grande? Bem, será uma
bela briga de foice!
O nó
logístico, ou melhor... a “noiva” é a cidadezinha sul mato-grossense de
Maracajú, que se tornará em um entroncamento de rodovias e ferrovias que
captarão as produções da região, Rondônia e conecta-as com as ferrovias que as
levarão pro sul, porto de Santos ou via ferrovia Norte-Sul que vai até o porto
de Itaqui, no Maranhão.
As modernas
ferrovias de bitola métrica (larga) têm o dobro ou triplo da capacidade da nossa
velha ferrovia Curitiba-Paranaguá do tempo do trem à vapor com bitola estreita,
construída por Dom Pedro II (daí o nome oficial do cais do porto de Paranaguá) e
inaugurada pela Princesa Isabel em 1885!
Ferrovia Norte-Sul que liga o centro-oeste brasileiro ao porto de Itaqui-MA e outros ramais. Moderna e de alta capacidade de carga com bitola métrica (larga).
A Ferroeste
tem seu pequeno trecho de 248 quilômetros no interior do Paraná, ligando
Cascavel à Guarapuava. O “pulo do gato” será ligar Maracajú até Guaíra (PR) e
estender este ramal até Cascavel, cujos trens vêm a pleno com as cargas
produzidas na região e Paraguai até Guarapuava, que através de nova estrada
seguiria até Paranaguá, via Irati e São José dos Pinhais e desce a serra... tudo
por uma moderna ferrovia em paralelo à velha e imperial atual estrada de
ferro.
Era esse o
plano que discutíamos até 2010, viável e com baixíssimo impacto ambiental, em
especial na Serra do Mar, pois iria aproveitar em muitos trechos abertos pelas
torres de alta tensão da Copel.
Mas, o que se
discute hoje, é uma outra situação em que a ferrovia continua com direção ao
porto de São Francisco do Sul (SC). Ora, pra que isso aconteça, uma imensa
destruição ambiental deverá ocorrer, vejamos:
O novo
traçado pelo que entendi da notícia atual passará pelo estuário e manguezais da
baía de Paranaguá por cima da ilha dos Valadares, o trem apitaria nos terminais
da Techint e no futuro Porto Pontal. Correrá em paralelo às praias de Pontal do
Sul, Shangri-lá, Ipanema, Praia de Leste, passa por Matinhos, passa por cima da
baía de Guaratuba com uma bela ponte rodoferroviária (ou apenas ferroviária?)
apita para saudar os guaratubanos.
O maquinista
da janela gritará: “... estaçãooo Guaratubaaa!!!...” e ao som de "O Trenzinho do
Caipira" de Villa-Lobos, a longa composição seguirá faceira para Itapoá (SC).
Afinal, não teria sentido ir pra São Chico sem antes dar uma paradinha no porto
Itapoá e depois dar um salto por cima da baía de Babitonga.
Claro que
estando por ali, não custa dar um “pulinho” em Joinville e Araquari..., ou o
lobby industrial da região vai ficar em silêncio?
Como se
comportarão os órgãos ambientais para que se rasguem quilômetros de manguezais,
restingas e mata atlântica para o binário desnecessário?
Comboio ferroviário da ALL em direção ao porto de Paranaguá pela imperial estrada de ferro construída por Dom Pedro II, inaugurada em 1885 pela Princesa Isabel. Ainda em operação de baixa produtividade. Repare a bitola estreita dos trilhos, usada desde à época das locomotivas à vapor.
Esses
projetos são tão complexos e sua concepção teórica, que as discussões e embargos
judiciais extrapolarão os mandatos de quem os discute. Já sofri estas
experiências na pele. As obras portuárias e dragagens que foram iniciadas em
2012, com bandinhas e discursos políticos para desatar a fitinha de inauguração,
se tornaram possíveis hoje pelo trabalho de minha equipe desde o início de 2009
ter se “atrevido” a negociar com o Ibama em Brasília um acordo
técnico-operacional que desatou o nó ambiental portuário. Isso tudo sem destruir
um pé de mangue ou florestas nativas. Três anos se passaram desde a primeira
conversa até a prática!
Sorte mesmo
teve o imperador Dom Pedro II, em cinco anos construiu a ferrovia ligando
Curitiba à Paranaguá, que há 127 salva os portos de Paranaguá e Antonina do
colapso logístico. Obrigado Excelência.
Enquanto
isso, fiquemos à espera do trem... “pui puiii... estaçãooo Pontaaal...
Matinhooos... Guaratubaaa...!!!”
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É a minha
opinião.
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